segunda-feira, 30 de julho de 2012

Carta para o lado de lá #1




Por vezes estas coisas voltam, não é? É como as estações do ano que vão dando lugar umas às outras, num ciclo em que as formas de vida se vão alterando. As estações, neste caso, são a intensidade com que a saudade me ataca e como ela o faz. As formas de vida que se alteram talvez sejam os meus estados de espírito… se é que alguma vez ele se chegou a alterar verdadeiramente desde aquele dia, ou se simplesmente adormeceu num sono que é interrompido quando essa tal de saudade decide abrir a porta do quarto e acorda-lo com o barulho mais estridente possível, para que o seu humor seja igual ao de um desses seres diretamente vindos das trevas.
É quando aquela zona frágil choca com um pedaço de betão, mas não causa um hematoma, abre a ferida, mais uma vez. Os pedaços daquela linha, que parecia ser resistente a tudo e mais alguma coisa, simplesmente rasgam, rebentam e o que acontece?  Bem, tal como acontece com qualquer ferida, volta a sangrar. Em tempos, o sangue libertado por ela era diferente, era mais fluido, e facilitava esta pseudocicatrização. Mas agora não é assim. Este líquido que é tão precioso, que nos faz prender à vida ou que está ligado à morte, escrevi “morte” porque é do que realmente se trata e porque os eufemismos já não são mais capazes de amenizar este sofrimento. Agora, o sangue não é “libertado”, é jorrado. Agora, ele passou a ser viscoso e , consequentemente, a sua passagem para o lado de fora tornou-se mais dolorosa.
É doloroso, mas, contrariamente, tem toque macio como cetim. Provavelmente, o meu corpo já se acostumou, talvez esteja mal acostumado.
Resumindo: A puta da dor voltou, e eu vou ter de voltar a cuidar da ferida sozinha, como sempre fiz.
A maior ironia e, simultaneamente, a maior antítese de todas: O mais difícil da vida é a morte.
Com eterna saudade,
A tua miúda.

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